domingo, 23 de janeiro de 2011

Ao final, o fim

Esta é a última postagem deste blogue, que não será apagado, pois é o testemunho de uma insatisfação que não foi vencida. Não digo que eu não goste dele, pois me diverti bastante ao construí-lo. Também não posso dizer que não aprenda nada com este ofício, cujo exercício é uma escola em si mesma. Muito menos poderia dizer que me faltem assuntos. Exemplos de temas que eu gostaria de abordar seriam as merecidas aposentadorias dos ex-governadores, o caso Cesare Battisti e as declarações do ministro Aloízio Mercadante sobre as enchentes. Ou seja, eu poderia seguir com esta crônica política, mas o fato é que me cansei de apenas escrever sobre gente medíocre. Sinto a necessidade de enveredar por algo mais estrutural, irreversível, profundo. É mais fácil agredir espantalhos do que monstros reais, mas os espantalhos servem como preparação. Talvez este blog tenha sido algo como um sonho de uma letargia. A gordura gasta nesta hibernação é agora musculatura para uma viagem que só se faz uma vez. Agradeço aos que me leram, e aos que se manifestaram. Lamento apenas não ter recebido críticas mais duras, pois são o tipo de manifestação que acreditava seriam ensejadas. Que esta despedida seja um até breve, e que nos encontremos novamente noutras linhas.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

a volta da boneca pródiga

O ex-ditador haitiano Jean-Claude Duvalier, o Baby-Doc, retorna ao seu país. Ele diz que veio "para ajudar". O sr. Duvalier fugiu do Haiti após uma revolta popular contra os seus quinze anos de desgoverno. Asilou-se na França e agora resolve voltar. Por qual motivo, eu não sei, mas vou propor uma hipótese, que pode evidentemente estar errada.

Dizem que Baby-Doc desviou US$ 100 milhões. Quanto será que ele ainda tem? Ladrões não costumam economizar. Vivendo como um príncipe na costa mediterrânea nos últimos 25 anos, não acredito que tenha sobrado muita coisa na conta do sr. Duvalier. Se isto é verdade, a sua única chance de sobreviver é voltar ao único ofício que aprendeu na vida: o roubo. Daí a o retorno ao Haiti do seu filho mais ilustre. Esta é uma prova que vodu não passa de uma invenção de algum fabricante de bonecas, nem eliminar esta peste ele conseguiu.

A Tunísia não é logo ali

Há cerca de um mês, um verdureiro tunisiano ateou fogo ao corpo após ter seus produtos confiscados. Um gesto desesperado ante o enorme desemprego que assola a Tunísia. Este ato foi precursor de uma onda de protestos que culminou com a renúncia do ditador do país, Ben Ali. Para o blogueiro Gustavo Chakra, o governo teria sobrevivido se tivesse um inimigo externo para culpar. Ou seja, segundo a hipótese do sr. Chakra, se tivesse um inimigo externo, o governo tunisiano poderia dizer que o causador do desemprego, e também do suicídio do verdureiro, é o imperialismo americano, ou talvez o neoliberalismo, ou a globalização, ou algo parecido. Depois desta explicação bastante plausível, os cidadãos pacificamente retornariam às suas casas. A este texto, eu escrevi o seguinte comentário:

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14/01/2011 - 17:05
Enviado por: Sergio Giardino

Esta hipótese de que o governo caiu pois o ditador não tinha nenhum governo externo para culpar pelos problemas internos é no mínimo, leviana. Ridículo acreditar que pessoas insatisfeitas por estarem desempregadas voltariam a suas casas pacificamente com uma desculpa destas. Melhor se informar direito antes de fazer especulações infundadas.

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A ele, Chakra respondeu:



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14/01/2011 - 17:08
Enviado por: Gustavo Chacra

Sergio, este foi o argumento usado no Irã para realizar contra-manifestações em 2009. E funcionaram bem. Atos gigantes a favor do governo foram convocados. O Ben Ali não poderia agir da mesma forma. E tudo bem você discordar (isso é blog, não tese de PhD), mas seja um pouco mais educado

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Ou seja, escrever num blogue nos dá o direito de propagar idéias equivocadas, afinal, blogue não é tese de doutorado. Além disso, quando o blogueiro escreve algo errado, nós podemos "discordar", mas nunca dizer: "está errado", pois isto constitui uma violação das regras do convívio social.




notícias

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Chove na horta em janeiro

O apocalipse chegou mais cedo para centenas de pessoas atingidas pelas chuvas. Tragédia para uns, oportunidade para outros. Aos políticos estes acontecimentos são uma verdadeira benção. Como diria Maquiavel, o bem se faz aos poucos, e mal de uma única vez. A destruição de uma semana vai movimentar bastante a economia dos durante todo o ano. Ouvi dizer R$600 milhões, uma importância considerável e que enseja boas oportunidades de ganho aos corruptos. Sem contar que a cifra tende a aumentar. A indústria de automóveis também já esfega as mãos para repor os carros e ônibus destruídos, sem falar nas auto-peças. A construção civil, então, nem se fala: construir num ano para destruir no próximo. Este é o verdadeiro crescimento sustentado da economia, pois o desperdício indispensável ao capitalismo está garantido.

Muitos empregos serão gerados, e os cidadãos ficarão bastante satisfeitos. Algumas pessoas morreram, mas a gratidão dos sobreviventes com os seus salvadores será mais do que suficiente para garantir a próxima eleição. A comoção gerada por uma criança morta ou um idoso desenterrado vivo são ótimos para fomentar o patriotismo, e as religiões também ganham mais alguns prosélitos, seja pelos atingidos direta ou indiretamente, seja pelos tele-compassivos. Ou seja, só mesmo alguém muito fora da realidade para imaginar que existe interesse extra-retórico de quem quer que seja em acabar com as enchentes de janeiro. Até as próximas, se deus quiser.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Alckmin: o bom samaritano

O discurso de posse de Geraldo Alckmin ao governo paulista é expressão de algo que somente a mistura de política e cristianismo pode gerar. Primeiro veio uma invocação ao sacrifício de governar digna de um Cristo. A modéstia e austeridade que ele julga necessárias ao cargo são dificilmente encontradas no vulgo, mas abundam nele próprio, é claro. Como bom cristão, servidor e temente ao altíssimo, Alckmim é devoto de alguns santos, e em seu altar figuram Covas, FHC e Serra. Alckmim sabe que os caminhos do senhor são tortuosos, mas mesmo assim não deve nunca se afastar dele, e isso significa que nada muda em São Paulo nos próximos quatro anos. Incrível que alguém se eleja para qualquer coisa com a proposta de nada fazer além do óbvio, sem ter uma única idéia. Não que mudanças bruscas seriam necessárias, mas ele não tem qualquer intenção fora deixar tudo como está, pois graças aos seu santos-padrinhos que o inventaram e também castigaram, o estado vai a mil maravilhas. Sobre Dilma, usou a expressãozinha da moda anti-criatividade que domina tanto o Planalto como o Bandeirantes: ele terá uma "relação republicana" com o governo federal. O que quer dizer? Nada, pois é apenas uma oração a mais no terço político rezado mecanicamente por Alckmin.

Bye Bye, Cartum


Neste domingo ocorre um plebiscito sobre a secessão da região sul do Sudão. Esta região de religiões cristã e animista pretende separar-se do norte predominantemente muçulmano. A foto mostra um dos símbolos da campanha pela separação, uma mão acenando um adeus a Cartum, a capital.

Este tipo de evento sempre suscita uma discussão sobre liberdade, pois o sul sudanês diz-se explorado pelo norte. Países grandes como o Sudão, cujo território é cerca de 30% do brasileiro, são melhor descritos como um império que como uma república: um determinado grupo controla o estado, cujo interesse não é o bem-estar da população, mas sim o enriquecimento deste e dos seus controladores. Esta situação é mais difícil de ser mantida em estados pequenos, onde a população está mais próxima dos governantes.

O Brasil possui uma analogia com a situação sudanesa. Como tal, é um país imenso, com muitas realidades diferentes e um povo cuja única identidade é a língua. As dimensões do país desfavorecem o contado da população com os seus representantes, que consideram-se uma espécie de nobreza. Nesse sistema político, as populações nunca estão satisfeitas. Os estados mais ricos dizem sustentar os mais pobres e estes se dizem explorados pelos mais ricos, um paradoxo onde todos se dizem explorados, mas na realidade todos são vítimas de um único explorador: os políticos. Quem sabe um dia as populações dos estados brasileiros poderão tomar consciência da sua condição de explorados e dar um adeus semelhante à Brasília.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Dilma, a presidenta muita competenta

Começa sob maus auspícios o reinado da sra. Dilma Roussef, pelo menos é o que se depreende dos seus dois discursos na cerimônia de posse. O primeiro deles foi bastante bem criticado por Demétrio Magnoli numa entrevista que pode ser vista na TV Estadão e cujos argumentos não repetirei. A minha primeira impressão destes pronunciamentos é que eles mostram a completa falta de criatividade da sua autora. A primeira evidência deste fato é a maneira como ela dirige-se aos seus governados: "queridos brasileiros e queridas brasileiras". Qualquer semelhança com os discursos de José Sarney não é coincidência. Além disso, utilizar-se de um bordão criado por um dos piores presidentes da história brasileira indica que ela não vê como grave o desastroso governo de Sarney. Talvez seja um afago a um de seus maiores aliados, como pode ser visto na influência deste último no ministério de Dilma, ou talvez exista uma admiração intelectual por Sarney, além da acomodação de forças políticas. Qualquer uma das hipóteses me parece péssima.

No conteúdo dos discursos a sua forma a falta de inventividade fica patente. No primeiro deles, no plenário da câmara dos deputados, Dilma repetiu promessas eleitorais. Não foi capaz de traduzir as metas de crescimento econômico e reformas legais em valores. É de esperar-se que os valores, que são os fins, precedam as ações, que são os meios. Dilma não sabe disso, ou não é capaz de relacionar as duas coisas. Ao ar livre, no parlatório e dirigindo-se diretamente à população ali presente, repetiu trechos inteiros do discurso anterior. Ou seja, no primeiro discurso não conseguiu dizer nada do que já não tenha dito e no segundo não conseguiu sequer dizer as mesmas coisas de outra forma. Além da má qualidade dos textos, é oradora inconstante, interrompe o discurso para pensar e transmite uma sensação de insegurança. Decididamente esta senhora não tem o dom da palavra.

Outra evidência da falta de imaginação de Dilma está num pequeno detalhe, ela chama-se de presidenta e não presidente. Mais uma vez, uma cópia. A polêmica do uso do termo já existe com a presidente Cristina Kirchner da Argentina, que também quer ser chamada de presidenta. Meu léxico on-line me informa que o vocábulo existe, mas tenho uma certa má-vontade com ele. Me explico: presidente vem do verbo presidir, e é aquela pessoa que preside, assim como amante é quem ama, estudante quem estuda, assistente quem assiste, etc etc. Por esta razão não dizemos amanta, estudanta ou assistenta. Esta forma tem origem no antigo particípio presente do latim, que é algo assemelhado ao gerúndio, uma forma que transmite a idéia do tempo presente. Esta sensação também pode ser obtida de adjetivos com terminação semelhante à dos substantivos supracitados, como constante, incessante, atuante, retumbante, etc. Podem dizer que este é um fato irrelevante, mas em certos detalhes é possível observar algo que se queria ocultar. A primeira coisa é o boato de que Dilma seria uma pessoa de grande cultura. Duvido muito, pessoas cultas normalmente conhecem sua língua com alguma profundidade, o que parece não ser o caso. Isto também pode ajudar a entender a preferência de Lula por Dilma. Ignorantes como Lula não têm muita afinidade pelos cultos e se ele escolheu Dilma para ser sua sucessora, talvez eles tenham mais em comum do que pareceria numa primeira observação. Um segundo problema é a superstição que está embutida no uso da linguagem. Supersticiosos acreditam no poder sobrenatural das palavras, mesmo das que vêm desacompanhadas de ações. Talvez algumas feministas acreditem que o uso da palavra presidenta tenha a capacidade de inculcar na cabeça de quem a ouve a idéia de igualdade gêneros, algo característico da palavras-mágicas de contos de fadas. Finalmente, a insistência de Dilma em chamar-se de presidenta demonstra seu lado autoritário, pois indica que Dilma acredita que o cargo que provisoriamente ocupa lhe faculta o direito de outorgar leis gramaticais como quem cria impostos. Talvez em breve ela queira mudar também a concordância de outras palavras que atualmente não sofrem flexão de gênero, e então o título desta postagem segue como sugestão para a língua futura.